VITIMISMO E GRATIDÃO

– autoria: Indira Moretti

 

As relações humanas são complexas e nem sempre ocorrem de forma a atender as expectativas das partes envolvidas – podem ser harmônicas, prazerosas, conflituosas, desafiadoras e até arbitrárias.

A cultura, os valores, qualidade da comunicação que se efetiva, os interesses pessoais das partes, a flexibilidade e capacidade de negociação são aspectos que destaco como impactantes nas relações e negociações humanas.

Diferentes personagens, com diferentes idades, formações, hábitos culturais e níveis de maturidade emocional, apresentam diferentes respostas a uma dada circunstância, pois a vivenciarão sob diferentes perspectivas . Somos seres sociáveis, todos da mesma espécie (humana), mas somos únicos em nossa complexidade psicossocial.

O sentimento de vitimização é um comportamento comum e nada saudável que coloca os indivíduos em situação nada favorável para reflexão sobre sua parte na responsabilidade das circunstâncias a respeito das quais assumem uma postura de vitimismo.

Vitimismo pode ser entendido como “sentimento” de vítima, de ter sido submetido a alguma forma de opressão ou arbitrariedade.

Descartando as situações válidas (das quais este texto não tratará) e dando ênfase para os impasses relacionais do dia-a-dia, o vitimismo pode manifestar-se como uma forma equivocada de isenção de responsabilidade pessoal sobre acontecimentos, acompanhada de atribuição de culpa a outros sobre o desfecho de situações cotidianas vividas em grupo (entende-se por grupo dois ou mais indivíduos).

O vitimismo nem sempre ocorre de forma intencional ou consciente e é um sentimento que se manifesta através de comportamentos aprendidos socialmente e comuns em vários âmbitos sociais (família, amigos, escola, trabalho, etc). E que, independente da percepção ou não do indivíduo sobre esse aspecto atitudinal, tende a se repetir seguidamente, resultando em um posicionamento imaturo, não refletido, improdutivo, queixoso, autocentrado, que frequentemente atrasa a dissolução de conflitos, o crescimento pessoal do indivíduo ou grupo e pode até estagnar a vida do indivíduo ou a produtividade de uma equipe/grupo.

E o que o vitimismo tem haver com gratidão?

Quando equivocadamente nos eximimos da responsabilidade sobre o desfecho das situações vividas e tendemos a “culpar” os demais interlocutores pelos desfechos, nossa tendência argumentativa caminha no campo da queixa, insatisfação, amargura, julgamento e ressentimento.

Gratidão não é uma qualidade nata e não germina, nem se fortalece nesse clima.  Gratidão é uma virtude que precisa ser aprendida e fortalecida no dia-a-dia.

Aprendemos a ser gratos quando nos dispomos à reflexão, encontrando melhores respostas dentro dos cenários em que transitamos e de dentro de nós mesmos.

Encontrando a melhor forma de diante dos fatos nos posicionarmos, o melhor papel que possamos interpretar, a melhor decisão possível para o assunto. Aquela que melhor desfecho ofereça à situação e aos envolvidos – e não apenas a melhor solução para os nossos interesses pessoais.

Somos protagonistas do mundo real, inseridos em diversos palcos sociais num só dia. E é assim tanto para nós, como para os atores com quem contracenamos. Precisamos perceber que há muito mais coisas acontecendo ao nosso redor, assim como com aqueles com quem nos relacionamos nos grupos com os quais atuamos. Perceber que o mundo gira e não é em torno de nós.

Podemos nos tornar muito melhores quando conseguirmos refletir e crescer como indivíduos e/ou grupo, num processo de melhoria contínua.

Enquanto nos rendermos à postura de vitimismo, sentindo-nos afetados por tudo e todos, ferimo-nos por dentro com desnecessários sentimentos de frustação, rejeição, dor, medo e sofrimento. E a tendência será dar vazão à raiva, dificultando negociações e arrastando conflitos.

Neste cenário não há espaço para o exercício da reflexão realista, do esclarecimento, da sabedoria e muito menos da gratidão.

Sair da posição de vítima é assumir a do tomador de decisão. É posicionar-se de forma ativa, fazendo o que precisa ser feito para o alcance dos resultados individuais e/ou grupais.