PRIMEIRA PARADA: ESTAÇÃO “QUEM SOU EU”?

autoria: Indira Moretti

 

Ao aproximarmo-nos dos pequeninos, talvez apenas para puxar conversa, alguns adultos gostam de perguntar: “O que você vai ser quando crescer?”

Independente da resposta, seja ela qual for e ainda que não haja resposta, há uma certa intenção no efeito desta pergunta que, mesmo não plenamente consciente, leva a criança a projetar-se para o futuro, imaginando-se como profissional de alguma área específica do trabalho.

Recorrendo ao próprio repertório de experiências, ainda pouco vasto, eis a criança vasculhando na memória uma cena que possa compor a resposta.

No decorrer do desenvolvimento infanto-juvenil, esta resposta pode mudar drasticamente, pois o leque de opções se abre. Não se trata da resposta certa, nem da melhor resposta.

Trata-se de sonhar, fazer planos, querer “ser alguém”.

Um viés. Porque “ser alguém” vai muito além da carreira profissional que escolhemos.

Somos seres biopsicossociais e espirituais.

“O que você vai ser quando crescer?” é uma pergunta desafiadora para as crianças. Caberia fazê-la a um adulto?

Ousei perguntar para vários adultos e, dentre tímidas respostas, algumas com embaraço, outras evasivas, uma delas me chamou a atenção: “isso não é pergunta que se faça para adultos, isso é pergunta que se faz para crianças”, e assim o assunto ficou encerrado.

Então, ri-me por dentro ao pensar: que bom que ainda sou criança!

Não se trata de ter uma resposta pronta, nem de ter ou não assumido um papel profissional na vida adulta. Não se trata de ter ou não profissão, cargo e carreira.

Trata-se de onde estamos e onde queremos realmente estar.  Trata de olhar-se no espelho e perceber se seus sonhos foram ou não concretizados. Trata-se de sonhar e encantar-se com o trabalho de suas próprias mãos.

E de pensar que o Tempo nos concede um longo fio através do qual podemos tecer nossas histórias, onde podemos querer concretizar ideias e ideais nesta trajetória.

Histórias que se entrelaçam, entre fios que se embaraçam e depois seguem a diante.

Ainda frente ao espelho, há os momentos que podemos ousar chamar de “ora da verdade”, pois é difícil mentir pra si mesmo.

Momento de responder: “o que eu fiz até aqui?”, “quem sou eu?”, “o que desejo ser?” “há vontade dentro de mim?”

Por mais complexo ou simples que isso possa parecer. É bem verdade que estas verdades moram em nós. Repousam solenes em nosso cerne.

Não viemos ao mundo a passeio. A vida tem um plano para nós. E nós fazemos planos nessa vida. Compreender isso é base para descoberta e “sentido de vida”.

Nada pode ser mais oco do que a sensação de que nossa vida “não faz sentido”.

Atender ao que a vida quer de nós e extrair dela o que aprendemos a desejar é arte, é desafio, é aprendizado, é errar e acertar, até conseguir voltar ao eixo original para o qual a vida nos chamou.

Pode ser doloroso perceber que não somos o que gostaríamos de ser.

Pode ser doloroso perceber que nos distanciamos tanto do plano original, que nem sabemos como remodelar nossas histórias.

No entanto, esse movimento de reflexão, que inicialmente pode ser percebido como “desilusão”, pode ser a chave para abrir outras oportunidades.

Além disso, as desilusões não são tão nocivas como aparentam, pois significa deixar de estar iludido.

É no silêncio de nossas reflexões que podemos encontrar miraculosas respostas. Ainda assim, não se iluda. Esse processo é longo e requer persistência.